Como Criar uma Política de Segurança Informática para uma Pequena Empresa
Índice
1. Introdução
Vivemos numa era em que a informação é um dos activos mais valiosos de qualquer organização — muito em particular nas Pequenas e Médias Empresas (PMEs), as quais muitas vezes não têm departamentos dedicados à cibersegurança. Com o aumento constante de ataques informáticos, desde o phishing até ao ransomware, criar uma política de segurança da informação deixou de ser opcional: é uma exigência estratégica, operacional e legal.
De acordo com o Relatório Anual de Segurança da Cisco (2024), mais de metade dos ataques cibernéticos bem-sucedidos tiveram como alvo empresas com menos de 100 colaboradores. As consequências incluem perda de dados críticos, paragem de operações, danos reputacionais e multas por incumprimento do Regulamento Geral de Protecção de Dados (RGPD).
Este artigo mostra, passo a passo, como uma PME pode construir uma política de segurança profissional, robusta, prática e adaptada à sua realidade.
CHECKLIST RÁPIDO: FUNDAMENTOS
Prioridades Imediatas:
- ▢ Nomear responsável pela segurança (mesmo a part-time)
- ▢ Implementar MFA em todos os acessos críticos
- ▢ Backups automáticos + regra 3-2-1 (3 cópias, 2 suportes, 1 externa)
- ▢ Encriptação total de portáteis/dispositivos móveis
Documentação Essencial:
- ▢ Mapa de activos e matriz de riscos
- ▢ Plano formal de resposta a incidentes
- ▢ Termos de confidencialidade assinados
Acções Periódicas:
- ▢ Formação semestral + simulação de phishing
- ▢ Teste de recuperação de backups (mensal)
- ▢ Auditoria de acessos (trimestral)
2. Por que é que uma Política de Segurança é Essencial?
2.1. Redução de Risco
Uma política bem estruturada reduz a superfície de ataque ao definir comportamentos aceitáveis, procedimentos técnicos obrigatórios e responsabilidades claras. Por exemplo, ao proibir o uso de pen drives pessoais não encriptadas, elimina-se um vector comum de infecção por malware.
2.2. Conformidade Legal (RGPD e outros)
O RGPD obriga todas as empresas que tratam dados pessoais a implementar medidas técnicas e organizativas adequadas. Uma política de segurança documentada é uma evidência clara de conformidade.
Exemplo: A ausência de política levou uma clínica dentária a ser multada em 8.000€ por não conseguir provar que controlava acessos a ficheiros clínicos.
2.3. Resiliência Operacional
Incidentes inevitavelmente acabarão por ocorrer. A política define como reagir, quem faz o quê, em que ordem, com que ferramentas. Isto reduz tempos de resposta, minimiza danos e acelera a recuperação.
2.4. Cultura Organizacional
Uma PME com política de segurança promove o envolvimento de todos. Os colaboradores deixam de ver a segurança como “coisa da informática” e passam a entender que proteger os dados é proteger o negócio.
3. Passos Iniciais para Criar uma Política
3.1. Identificar os Activos da Informação
Faça uma lista dos activos digitais e físicos relevantes:
- Computadores, servidores, routers, NAS, etc.
- Software de facturação, CRMs, e-mails, …
- Dados pessoais e financeiros de clientes
3.2. Avaliar os Riscos
Para cada activo, avalie:
- Ameaças (ex: ransomware, furto, erro humano)
- Vulnerabilidades (ex: ausência de backups, falta de MFA – Multi Factor Authentication)
- Impacto (financeiro, legal, operacional)
Activo | Ameaça | Vulnerabilidade | Prob. (1-5) | Impacto (1-5) | Risco (P×I) | Medidas de Mitigação |
Dados clientes | Ransomware | Backups não testados | 4 | 5 | 20 | Backup diário + teste mensal |
Email corporativo | Phishing | Falta formação | 5 | 4 | 20 | Formação trimestral + simulações |
Servidores | Acesso não autorizado. | Falta MFA | 3 | 5 | 15 | Implementar autenticação 2 factores |
3.3. Obter Apoio da Administração
A política só terá sucesso se for suportada pela administração. Esta deve:
- Nomear um responsável por segurança
- Alocar orçamento mínimo (antivírus, formação, backups, etc)
- Aprovar e comunicar a política aos colaboradores
3.4. Escolher um Modelo Simples
Uma PME não precisa de uma política com 80 páginas. Comece com um documento de 4–6 páginas com:
- Objectivos e âmbito
- Regras de conduta
- Medidas técnicas obrigatórias
- Plano de resposta a incidentes
4. Componentes de uma Política de Segurança
4.1. Objectivos da Política
- Proteger a confidencialidade, integridade e disponibilidade da informação
- Reduzir o risco de incidentes que possam comprometer a operação
- Estabelecer regras claras para todos os colaboradores
- Demonstrar conformidade legal (ex: RGPD, contractos com parceiros)
4.2. Âmbito de Aplicação
Aplica-se a:
- Todos os colaboradores, internos ou externos
- Todos os equipamentos, redes, contas e sistemas usados em nome da empresa
- Todas as localizações onde haja acesso a dados da empresa (escritório, casa, viagem)
4.3. Responsabilidades dos Colaboradores
Cada colaborador deve:
- Usar credenciais seguras e não partilhadas
- Cumprir as regras de uso aceitável
- Reportar incidentes ou suspeitas
- Participar nas formações obrigatórias
4.4. Classificação e Protecção da Informação
- Confidencial: contratos, passwords, dados pessoais
- Interna: emails, políticas internas, notas de reunião
- Pública: site da empresa, anúncios
Medidas incluem encriptação, restrição de acesso e partilha apenas em canais seguros.
4.5. Gestão de Acessos
- Princípio do privilégio mínimo
- Revisão trimestral dos acessos
- MFA em contas sensíveis
- Revogação imediata de acessos de ex-colaboradores
4.6. Segurança Física
- Acesso limitado a zonas com servidores
- Portáteis com cabo de segurança
- Sensores de movimento ou alarme em salas técnicas
4.7. Segurança dos Sistemas e da Rede
- Firewalls e antivírus actualizados
- Segmentação da rede (ex: convidados vs. administrativa)
- Patching regular de sistemas operativos e aplicações
4.8. Utilização de Dispositivos e Equipamentos
- Política BYOD (Bring Your Own Device) clara e aprovada pela gestão
- Proibição de pen drives não encriptadas
- Portáteis devem ter discos encriptados
4.9. Política de Palavras-Passe
- Mínimo 12 caracteres, combinando letras maiúsculas, minúsculas, números e símbolos (#$!%)
- Sem reutilização
- Alteração periódica
- Uso de gestores de passwords recomendados
4.10. Cópias de Segurança (Backups)
- Diárias (automáticas) e semanais (offsite)
- Testes mensais de recuperação
- Backup encriptado
4.11. Gestão de Incidentes de Segurança
- Plano estruturado: identificar → conter → erradicar → recuperar → aprender
- Registo de incidentes
- Comunicação à gestão e/ou CNPD (Comissão Nacional de Protecção de Dados) (se aplicável)

4.12. Formação e Consciencialização
- Sessões semestrais obrigatórias
- Simulações de phishing
- Boas práticas incluídas no onboarding
4.13. Auditoria e Conformidade
- Auditoria interna anual
- Checklist de conformidade
- Actualizações à política após cada incidente relevante
5. Recomendações para Implementação
5.1. Comece Simples, melhore com o Tempo
Não tente criar um documento perfeito à primeira. Comece com uma versão funcional e melhore-a com base em auditorias, incidentes e feedback.
5.2. Nomeie um Responsável pela Segurança
Mesmo que acumule funções, é essencial haver um ponto focal para aplicar, monitorizar e actualizar a política.
5.3. Divulgar e Treinar
A política não deve viver num ficheiro esquecido. Organize formações, envie lembretes e use exemplos reais para que os colaboradores compreendam e respeitem as regras.
5.4. Defina Penalizações
Inclua consequências para violação da política, com base na gravidade da infracção: advertência, repetição de formação, suspensão ou medidas legais.
5.5. Integre com o Ciclo de Vida do Colaborador
Apresente a política logo na integração (onboarding). Faça revisões nas promoções, mudanças de função ou saída da empresa.
5.6. Faça Auditorias Regulares
Recolha métricas, avalie o cumprimento e adapte a política às novas ameaças tecnológicas, regulamentares ou operacionais.
6. Conclusão
Uma política de segurança eficaz não tem que ser complexa — precisa de ser prática, clara, compreendida e aplicada por todos. Ao definir regras simples, formar os colaboradores e aplicar medidas técnicas básicas, uma PME pode reduzir drasticamente os riscos de perda de dados, interrupções de serviço ou multas.
Talvez ainda mais importante: demonstra maturidade e compromisso perante clientes, parceiros e entidades reguladoras.
Um conselho: comece já hoje – documente a sua política, envolva os seus colaboradores e proteja o seu negócio com base em decisões informadas.
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Criado por Paulo Silva